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Home Pareceres Jurídicos até 2017 Declaração de reconhecimento de interesse do investimento para a região; Declaração de reconhecimento de interesse público.

Declaração de reconhecimento de interesse do investimento para a região; Declaração de reconhecimento de interesse público.

 

Solicita o Presidente da Câmara Municipal de …, por seu ofício de …, referência n.º …, a emissão de parecer sobre a seguinte questão:

Recentemente, este Executivo Municipal tem sido confrontado com a necessidade de se pronunciar sobre pedidos de declarações apresentados por empresas, visando obter objetivos bem diferenciados, a saber:

  1. “Declaração de Reconhecimento do Interesse do Investimento para a Região, prevista no n.º 4 do artigo 23.º, do RFAI, inserido no Código Fiscal do Investimento – Decreto-Lei nº 162/2014, de 31 de Outubro, e destinada à obtenção de redução ou isenção de impostos municipais – lMl e lMT.
  2. “Declaração de Deliberação Fundamentada de Reconhecimento do Interesse Público Municipal”, prevista na alínea a), do nº. 4, do artigo 5º, do Decreto-Lei nº 165/2014, destinada a instruir processo de viabilização de indústrias a laborar e não completamente licenciadas;

A emissão destas declarações é da responsabilidade da Assembleia Municipal, por proposta fundamentada da Câmara Municipal, conforme decorre da Lei nº 73/20I3, de 3 de setembro.

No decorrer da apreciação dos pedidos, da sua fundamentação e das respetivas deliberações tomadas pela Câmara Municipal, surgiram dúvidas na interpretação da Lei, ainda vigentes.

Assim, pergunta-se

DRIIR – Declaração referida no ponto 1.

  1. a) Se o pedido, analisado internamente pelos serviços técnicos da CM, e constatando que o mesmo não cumpre nenhum ou cumpre apenas alguns dos requisitos legais, previstos no artigo 22º do Código Fiscal do lnvestimento anexo ao Decreto-Lei nº 162/2014, de 31 de outubro, para beneficiar de eventual redução ou isenção dos impostos municipais em causa, deve, ou não, ser submetido à apreciação do Executivo Municipal?
  2. b) Se sim, tem o Executivo Municipal competência para fundamentar positivamente a proposta e submete-la à Assembleia Municipal, para esta reconhecer o interesse e emitir a respetiva declaração, sabendo que a requerente não satisfaz ou satisfaz apenas parcialmente as exigências da Lei aplicável?

DDFRIPM – Declaração referida no ponto 2.

  1. c) Se se verificar que a Câmara Municipal faz uma apreciação negativa, ou não suficientemente positiva sobre este pedido, razão por que delibera fundamentar negativamente a pretensão, deve, ou não, emitir a respetiva proposta e submetê-la à Assembleia Municipal?

 

Apreciando

  1. Do pedido

O presente pedido de parecer consubstancia-se em duas questões que apresentando-se formal e aparentemente como semelhantes, respeitam, contudo, a diferentes materialidades.

A primeira delas tem a ver com a emissão de uma declaração – declaração de reconhecimento do interesse do investimento para a região – exigida no âmbito e como requisito para atribuição de determinados benefícios fiscais[1], cuja emissão o Código Fiscal do Investimento[2] comete às assembleias municipais ainda que a declaração se refira a interesse para a região – situando-se, assim, no campo tributário e do apoio ao investimento (subsidiação/auxílios de Estado).

A segunda delas, no aspecto que para aqui releva, tem a ver igualmente com a emissão de uma declaração visando a regularização de situações (desconformes), mas agora no campo da gestão e ordenamento do território e urbanismo no espaço municipal e do licenciamento (regularização do licenciamento) de actividades económicas diversas aí instaladas (de forma irregular).

Questiona-se, quanto à primeira, se um pedido de um requerente, que ao ser analisado pelos serviços da camara se constata não preencher o requerente todos os requisitos legais, deve, ainda assim ser submetido à assembleia municipal e, em caso afirmativo, se a câmara municipal tem que fundamentar positivamente a proposta para que a assembleia reconheça positivamente o interesse regional, quando sabe que faltam requisitos legais ao requerente, pretenso beneficiário.

Quanto à segunda, a questão que se coloca é a de saber se quando a câmara municipal formula um juízo desfavorável, total ou parcialmente, à pretensão do requerente, denegando-lhe acolhimento, deve ainda assim submete-la à apreciação da assembleia municipal.

 

  1. Análise

2.1. O reconhecimento do interesse do investimento para a região previsto no artigo 23.º, n.º 4 do Código Fiscal do Investimento

2.1.1. De entre os diversos regimes de benefícios fiscais[3] previstos no Código Fiscal do Investimento, encontra-se o designado Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI)[4], com a natureza de auxílio de Estado com finalidade regional e, como tal, admitido pelo Regulamento (EU) n.º 651/2014[5].

2.1.1.1. O âmbito subjectivo do RFAI é definido no artigo 22.º, n.º 1, do CFI: podem dele beneficiar os sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º do mesmo código, e que são elencados na Portaria n.º 282/2014, de 30 de Dezembro.

2.1.1.2. Os benefícios fiscais concedidos no âmbito do RFAI consistem:

  1. na dedução à colecta de IRC[6] de uma percentagem[7] do valor das designadas aplicações relevantes[8], a efectuar a quando da liquidação de IRC respeitante ao período de tributação em que sejam realizadas as aplicações relevantes, até aos limites previstos no CFI[9];
  2. na isenção ou redução do IMI[10], aplicável de acordo com o previsto no CIMI;
  3. na isenção ou redução do IMT[11], aplicável de acordo com o previsto no CIMT;
  4. na isenção do Imposto de Selo[12], aplicável de acordo com o previsto no Código do Imposto de Selo.

2.1.2. Neste contexto, cabe sublinhar que quer o IMI quer o IMT são designados de “impostos municipais”[13], o que dá (a falsa) ideia de que eles não só são criados como são também administrados pelas autarquias locais, ao abrigo dos poderes tributários que a Constituição lhes confere[14]. Contudo, não é assim. Não só esses impostos (como todos os demais) são criados (lançados) por lei, por força do princípio (constitucional) da legalidade fiscal[15] (e, portanto, não são criados nem lançados pelas autarquias locais) como só o produto da sua cobrança é que verdadeiramente é municipal, constituindo receita do município onde é cobrado[16].

Por outro lado, em relação a qualquer desses impostos, todas as fases da respectiva gestão ou administração – ou seja, o seu lançamentoliquidação e respectiva cobrança – cabem a, e correm pela, administração fiscal do Estado, vulgo “finanças”[17].

2.1.2.1. Assim sendo, o reconhecimento da existência (verificação e declaração) ou a concessão[18] de benefícios fiscais em sede de IMI e IMT ‑ ou seja da isenção destes impostos ou da redução da sua imposição ‑ é tarefa que cabe exclusivamente à administração fiscal[19].

Contudo e apesar de assim ser, a lei prevê que em certos casos os municípios sejam chamados a pronunciar-se sobre (a concessão de) certos benefícios fiscais e, mais especificamente, quanto à própria gradação do benefício, quando a lei permita não só a isenção de imposto[20] mas também a redução da imposição fiscal (a operar, em regra, através ou da redução da taxa ou da matéria colectável)[21], em função dos objectivos a atingir com a concessão do beneficio.

2.1.3. A atribuição, no âmbito do RFAI, dos benefícios fiscais de natureza municipal (por incidirem sobre os imposto municipais sobre imóveis e sobre transmissão onerosa de imóveis) e, por essa razão, na dependência do poder tributário municipal[22], há-de pressupor necessariamente, antes do mais, e em razão de o concreto benefício a conceder poder consistir ou na isenção desses impostos ou na redução dos mesmos, a existência de normas (regulamentares ao nível do município) que disciplinem a essa concessão não só pela definição das concretas situações que mereçam o benefício como da gradação do benefício em função da ponderação (graduação) da relevância do investimento em termos do seu interesse para a região.

2.1.4. Definida que seja desse modo a fattispecie destes benefícios e analisado um dado pedido à luz da normação (regulamentar) aprovada para o efeito, coloca-se a questão de saber se face ao procedimento aprovatório previsto na lei – reconhecimento/concessão do benefício através deliberação fundamentada da assembleia municipal sob proposta da câmara – esta, (a câmara municipal) deverá submeter o pedido à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e possa] controlar) (para que aquela se pronuncie negativamente, presume-se), ou se, de forma mais extreme, a câmara municipal deve fundamentar positivamente um pedido ainda que constate que o mesmo não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a sua concessão.

Curiosamente, as questões antes referidas merecem respostas de sentido opostos.

2.1.4.1. A primeira delas – saber se a câmara municipal deverá (sempre) submeter o pedido (de beneficio) à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e ela possa] controlar) – merece resposta em sentido positivo, ou seja, caberá sempre (e unicamente) à assembleia municipal pronunciar-se em sentido positivo (reconhecendo) ou negativo (denegando o reconhecimento) sobre a verificação do interesse (público) municipal na concessão do benefício e a medida em que o mesmo deve ser concedido (sendo esse o caso), evidentemente louvando-se em proposta da câmara municipal.

2.1.4.2. A segunda questão – a que se prende com saber se a câmara municipal deve fundamentar positivamente um pedido ainda que constate que o mesmo não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a sua concessão – merece, obviamente, resposta negativa.

Na verdade, neste caso (como aliás em todos os casos) a assembleia municipal pronuncia-se sobre proposta camarária – não formula uma proposta própria; e a proposta da câmara deve basear-se e ter em conta a análise de todos os aspectos, e também os aspectos legais, que caibam dentro do seu poder de análise e proposta, razão pela qual a câmara municipal não pode nem deve, perante uma situação que se lhe afigura como não integralmente respeitadora do quadro normativo aplicável, ponderar uma proposta favorável à pretensão analisada e submetê-la assim à decisão da assembleia municipal. Na verdade, num caso assim, deve a proposta da câmara manifestar o seu pendor desfavorável à pretensão, para que a assembleia municipal a aprove nesse esse sentido.

2.1.4.3. Relativamente a ambas as referidas situações cabe realçar que:

  1. a) as razões que possam servir para fundamento de uma análise conducente a uma proposta negativa da câmara municipal (a ser posteriormente submetida à assembleia municipal) carecem, necessariamente, de caber dentro dos poderes de apreciação da câmara. Quer isto dizer que cabendo à administração fiscal conduzir o procedimento de concessão de benefícios fiscais, não pode a câmara municipal invocar argumentos que se situem fora ou para além do seu âmbito (material e procedimental) de intervenção para responder desfavoravelmente (e, obviamente, também de forma favorável), sob pena de vício de incompetência.
  2. b) em ambos os casos, essencial é que a administração (especialmente a câmara municipal) não faça silêncio sobre o assunto que lhe foi submetido, dispensando-se ou abstendo-se de se pronunciar (ainda que negativamente) sobre o pedido, alegadamente por, no seu entender, ele carecer de (qualquer) fundamento, e portanto, falecendo de argumentos que possam permitir a sua apreciação positiva (concedente) pela assembleia municipal[23].

 

2.2. deliberação fundamentada de reconhecimento do interesse público municipal na regularização de estabelecimento ou instalação prevista no artigo 5.º, n.º 4, al. a) do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro – Regime excepcional e transitório de regularização de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos

 2.2.1. Na segunda das questionadas situações, a que a epígrafe supra alude, o que está em causa é o reconhecimento (também pela assembleia municipal sob proposta da câmara municipal) do interesse público municipal na regularização – compreendendo-se nesta não só a regularização stricto sensu mas também a alteração e a ampliação – de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos em situação irregular, mormente face ao disposto nos instrumentos de gestão territorial vigentes.

Nos termos da lei, à luz do Decreto-Lei n.º 165/2014, este reconhecimento constitui mesmo condição prévia indispensável para que se possa desencadear o processo de regularização das situações irregulares, mormente em matéria de desconformidade da localização com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares, servidão administrativa ou restrição de utilidade pública (e, aparentemente, em face do que é dito na Portaria n.º 68/2015, de todo e qualquer pedido de regularização).

2.2.2. Também nesta situação o órgão competente para efectuar o reconhecimento do interesse público municipal é a assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal. É quanto resulta do disposto na al. a) do n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro, quando alude a deliberação fundamentada … emitida pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal.

Desta norma podem-se já retirar algumas conclusões consequenciais.

A primeira é a de que o órgão competente para o reconhecimento (ou seja, para a prática de um acto administrativo com esse conteúdo) é a assembleia municipal através de uma sua deliberação aprovada na devida forma.

Porém, aqui, a lei não se basta com a mera aprovação da deliberação por votação maioritária, exigindo também que essa deliberação seja fundamentada. O que implica que a acta contenha não só a descrição da proposta e da sua aprovação como também os fundamentos em que assenta o sentido da mesma, que podem ser dados por remissão para a proposta da câmara caso o conteúdo desta seja adequado a ser considerado como fundamentação.

Por outro lado, se a deliberação da assembleia municipal pressupõe e assenta necessariamente em proposta da câmara municipal, então cabe à camara municipal apreciar todo e qualquer pedido que lhe seja apresentado e propor à assembleia a decisão que melhor considere de acordo com o (conforme ao) interesse público municipal, quer ela seja a de reconhecimento desse interesse quer a do seu não reconhecimento.

Serve isto por dizer que mesmo no caso em que a câmara municipal venha a considerar, tudo apreciado, que o caso constante da pretensão do requerente não se reveste de interesse público municipal pelo que não é susceptível de merece o seu reconhecimento pelo órgão deliberativo municipal, não deve nem pode deixar de submeter à assembleia municipal uma proposta nesse sentido (negativo), pois que só a ela, assembleia, cabe em ultima instância, reconhecê-lo ou não.

Qualquer pronúncia da câmara municipal que pretenda arvorar-se a decisão final do assunto constituirá um acto anulável, por incompetência (relativa)[24].

De referir ainda que à luz do princípio da decisão[25] todos os órgãos da Administração Pública têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (…), pelo que a pura e simples omissão de pronúncia sobre um pedido de particular (ainda que o desatendimento do pedido seja plenamente justificável) permite a este intentar uma acção administrativa contra a entidade omitente, visando a sua condenação à prática do acto administrativo devido[26].

2.2.3. De referir, epilograficamente, que tratando-se o Decreto-Lei n.º 165/2014, ora em apreço, de norma excepcional e transitória[27], estas aludidas situações estão necessariamente circunscritas no tempo, sendo insusceptíveis de continuidade e indefinida repetição.

  

 

Concluindo

= I =

  1. No âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), previsto no Código Fiscal do Investimento, podem ser concedidos benefícios fiscais em sede de IRC sob a forma de dedução à colecta, em sede de IMI ou IMT sob a forma de isenção ou redução do imposto e em sede de Imposto do Selo sob a forma de isenção do imposto.
  2. Apesar do IMI e do IMT apresentarem a designação de “impostos municipais”, apenas o produto da sua cobrança é que verdadeiramente é municipal, constituindo receita do município onde é cobrado.
  3. Em relação a qualquer destes impostos, todas as fases da respectiva gestão ou administração – ou seja, o seu lançamentoliquidação e respectiva cobrança – cabem a, e correm pela, administração fiscal do Estado, vulgo “finanças”.
  4. Por essa razão, o reconhecimento da existência (verificação e declaração) ou a concessão de benefícios fiscais em sede de IMI e IMT, ou seja da isenção destes impostos ou da redução da sua imposição, constitui tarefa que cabe exclusivamente à administração fiscal.
  5. Contudo a lei prevê que em certos casos os municípios sejam chamados a pronunciar-se sobre (a concessão de) certos benefícios fiscais e, mais especificamente, quanto à própria gradação do benefício, quando a lei permita não só a isenção de imposto mas também a redução da imposição fiscal (a operar, em regra, através ou da redução da taxa ou da matéria colectável) , em função dos objectivos a atingir com a concessão do beneficio.
  6. A atribuição, no âmbito do RFAI, dos benefícios fiscais de natureza municipal (por incidirem sobre os imposto municipais sobre imóveis e sobre transmissão onerosa de imóveis) há-de pressupor necessariamente, antes do mais, a existência de normas (regulamentares ao nível do município) que disciplinem a essa concessão não só pela definição das concretas situações que mereçam o benefício, como da gradação do benefício em função da ponderação (graduação) da relevância do investimento em termos do seu interesse para a região.
  7. Definida que seja a fattispecie dos benefícios e analisado um dado pedido à luz da normação (regulamentar) aprovada para o efeito, a câmara municipal deverá submeter sempre o pedido à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e possa] controlar) pois que, em todo o caso, cabe unicamente à assembleia municipal pronunciar-se em sentido positivo (reconhecendo) ou negativo (denegando o reconhecimento) sobre a verificação do interesse (público) municipal na concessão do benefício e sobre a medida em que o mesmo deve ser concedido (sendo esse o caso), louvando-se, para o efeito, em proposta da câmara municipal.
  8. No caso em que a câmara municipal constate que um pedido não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a concessão do benefício, a proposta da câmara deve basear-se e ter em conta a análise de todos os aspectos, e também os aspectos legais que caibam dentro do seu poder de análise e proposta, pelo que a sua proposta deve manifestar o seu pendor desfavorável à pretensão, para que a assembleia municipal a aprove nesse esse sentido.
  9. As razões que possam servir para fundamento de uma análise conducente a uma proposta negativa da câmara municipal carecem de caber dentro dos poderes de apreciação da câmara, não podendo a câmara municipal invocar argumentos que se situem fora ou para além do seu âmbito (material e procedimental) de intervenção para responder desfavorável ou favoravelmente, sob pena de incompetência.
  10. Não pode a administração (especialmente a câmara municipal) fazer silêncio sobre o assunto que lhe foi submetido a apreciação, dispensando-se ou abstendo‑se de se pronunciar sobre ele (ainda que negativamente), alegadamente por, no seu entender, ele carecer de (qualquer) fundamento, e portanto, fenecendo-lhe razões que possam levar à sua apreciação positiva (concedente) pela assembleia municipal.

 

= II =

  1. O reconhecimento pela assembleia municipal sob proposta da câmara municipal do interesse público municipal na regularização, alteração e ampliação de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos em situação irregular, designadamente quanto aos instrumentos de gestão territorial vigentes, previsto no Decreto-Lei n.º 165/2014, constitui condição prévia indispensável para que se possa desencadear o processo de regularização dessas situações, mormente em matéria de desconformidade da localização com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares, servidão administrativa ou restrição de utilidade pública.
  2. Resulta do disposto na al. a) do n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro, quando alude a deliberação fundamentada … emitida pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal que:
    1. o órgão competente para o reconhecimento (ou seja, para a prática de um acto administrativo com esse conteúdo) é a assembleia municipal através de uma sua deliberação aprovada na devida forma.
    2. tal deliberação deve ser fundamentada. devendo a acta conter não apenas a descrição da proposta e sua aprovação como também os fundamentos em que assenta o sentido da mesma, os quais podem resultar de remissão para a respectiva proposta da câmara, caso possa ser considerada apta para tal.
  3. Cabe à camara municipal apreciar todo e qualquer pedido que lhe seja presente e levar à assembleia municipal a proposta que, sobre ele, melhor considere de acordo com o (e conforme ao) interesse público municipal, quer ela seja a de reconhecimento desse interesse quer a do seu não reconhecimento.
  4. Mesmo no caso de a câmara municipal considerar que o caso constante da pretensão do requerente não se reveste de interesse público municipal não deve nem pode deixar de submeter à assembleia municipal uma proposta, em sentido negativo, pois que só à assembleia municipal cabe pronunciar-se, reconhecendo ou não a existência desse interesse.
  5. Qualquer pronúncia da câmara municipal que pretenda ter a natureza de decisão final do assunto constituirá um acto anulável, por incompetência (relativa).
  6. À luz do princípio da decisão, todos os órgãos da Administração Pública têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (…).
  7. A pura e simples omissão de pronúncia sobre um pedido de particular (ainda que o desatendimento do pedido seja plenamente justificável) permite a este intentar uma acção administrativa contra a entidade omitente, visando a sua condenação à prática do acto administrativo devido.

  

Salvo sempre meliori judicio

  

Ricardo da Veiga Ferrão

(Jurista. Técnico Superior)

 

[1] Mais precisamente, no âmbito do designado Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), previsto no capítulo III do CFI.

[2] O Código Fiscal do Investimento (CFI) foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de Outubro, rectificado pela Declaração de Retificação n.º 49/2014, de 1 de Dezembro, e alterado pela Lei n.º 7‑A/2016, de 30 de Março.

[3] Entende-se por benefícios fiscais, à luz do disposto no Estatuto dos Benefícios Fiscais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, com posteriores alterações) as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.º, n.º 1, do EBF), e que podem assumir a forma de isenções, (…) reduções de taxas, (…) deduções à matéria colectável e à colecta, (…) amortizações e reintegrações aceleradas e outras medidas fiscais (…) (artigo 2.º, n.º 2, do EBF).

De sublinhar que os benefícios fiscais são considerados despesas fiscais, as quais podem ser previstas no Orçamento do Estado ou em documento anexo e, sendo caso disso, nos orçamentos das Regiões Autónomas e das autarquias locais (artigo 2.º, n.º 3, do EBF).

[4] Artigo 1.º, n.º 1, al. b), e Capítulo III (artigos 22.º a 26.º) do CFI.

[5] Artigo 1.º, n.º 2, do CFI.

[6] Artigo 23.º, n.º 1, al. a), do CFI.

[7] As diferentes percentagens são as definidas nas subal. 1) e 2) da al. a), do n.º 1, do artigo 23.º do CFI.

[8] O CFI considera aplicações relevantes os investimentos efectuados no elenco de activos constante do artigo 22.º, n.º, 2 do CFI, desde que se encontrem afectos à exploração da empresa.

[9] Artigo 23.º, n.º 2, do CFI.

[10] Artigo 23.º, n.º 1, al. b), do CFI.

[11] Artigo 23.º, n.º 1, al. c), do CFI.

[12] Artigo 23.º, n.º 1, al. d), do CFI.

[13] Diz o artigo 2.º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, que este diploma aprova (…) o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) (…)   (…) o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) (…) .

[14] Artigo 238.º, n.º 4, da Constituição.

[15] Vd. artigo 103.º, n.º 2, da Constituição.

[16] É o que resulta do disposto no artigo 14.º, als. a) e b), do Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais, constante da Lei n.º 73/2013, de 3 de Setembro, com posteriores alterações, ao afirmar que constituem receitas municipais …. o produto da cobrança do … IMI e do IMT.

Portanto, mas não unicamente por esta razão, apesar dos impostos em causa apresentarem a designação pomposa de Imposto Municipal, ambos continuam a ter uma feição manifestamente estadual. Sobre esta questão vd. José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 6.ª edição, 2010, págs. 56-60 (edição consultada; porém, há edição mais recente: 9.ª edição, 2016).

[17] Cfr. José Casalta Nabais, Direito Fiscal cit, págs. 57, e A Autonomia Financeira das Autarquias Locais, 2007, pág. 41-42.

[18] Como se diz em nosso anterior Parecer 100/2016, os benefícios fiscais ou operam automaticamente (benefícios automáticos) por resultarem directa e imediatamente da lei ou carecem de ser reconhecidos (benefícios dependentes de reconhecimentopressupondo um ou mais actos posteriores de reconhecimento [Artigo 5.º, n.º 2, do EBF] os quais podem consistir em um acto administrativo ou em um acordo entre a administração fiscal e os interessados [Artigo 5.º, n.º 3, do EBF], regulando-se o respectivo processo pelo disposto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário [Artigo 5.º, n.º 4, do EBF].

[19] Diz-se no antecitado nosso Parecer 100/2016:

2.1.2.1. O artigo 15.º do RFALEI diz que os municípios, relativamente a impostos e outros tributos a cuja receita tenham direito, podem ter os poderes tributários para a sua liquidação e cobrança(26). Porém, tais poderes só existirão nos municípios nos termos a definir por diploma próprio – facto que ainda não ocorreu.

[(26) Artigo 17.º, n.º 4, do RFALEI. O artigo 17.º, n.ºs 2 e 3, do RFALEI prevê a possibilidade de, no quadro que vier a ser definido em diplomas específicos, ainda inexistentes, as câmaras municipais virem a deliberar proceder à cobrança dos impostos municipais, pelos seus próprios serviços ou pelos serviços da entidade intermunicipal que integram, desde que correspondente ao território da NUTS III ou então, poderem transferir a competência de cobrança dos impostos municipais para o serviço competente das entidades intermunicipais que integrem. Em qualquer dos casos, porém, a lei nunca fala da liquidação, pelo que a competência para esta residirá sempre nos serviços do Estado, enquanto não houver diploma que especificamente venha regular a competência para o seu exercício.]

Temos assim, portanto, que aos municípios não assiste qualquer poder para a prática de actos de liquidação cobrança dos ditos impostos municipais – IMI, IMT e derramas – os quais continuam a ser liquidados e cobrados nos termos (…) [da] respectiva legislação, pelos serviços do Estado (administração tributária/”finanças”), razão pela qual as câmaras remuneram o Estado pela realização de tais tarefas(27), transferindo este, posteriormente, para cada autarquia a respectiva receita dos imposto cobrados, líquida dos referidos encargos(28).

[(27) Artigo 15.º, al. b), do RFALEI.] [(28) Artigo 17.º, n.º 5, do RFALEI.] [20] No caso da isenção (total) a decisão passa unicamente por, de modo binário, conceder/ não conceder o benefício/isenção.

[21] Respigando ainda o nosso citado Parecer 100/2016:

(…)os (…) [benefícios fiscais dinâmicos ou incentivos ou estímulos fiscais] visam incentivar ou estimular determinadas actividades, estabelecendo para o efeito, uma relação entre as vantagens atribuídas e as actividades estimuladas em termos de causa-efeito. Enquanto naqueles a causa do benefício é a situação ou actividade em si mesma, nestes a causa é a adopção (futura) do comportamento beneficiado ou o exercício (futuro) da actividade fomentada.(24)

[(24)JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal cit, págs. 434.]

Por estas razões e face ao quadro de óbvia indeterminabilidade e variação das potenciais situações a considerar, bem se compreende (…) [não só] que os incentivos fiscais, que não raro assumem carácter selectivo ou mesmo altamente selectivo, tenham carácter temporário, (…) como a liberdade do legislador, mormente para conceder uma margem de livre decisão à administração tributaria, tenha necessariamente de ser maior do que aquela de que dispõe em sede dos benefícios fiscais estáticos.(25)(sublinhado nosso)

[(25) JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal cit, págs. 435.]

2.1.1.5. Se atendermos agora ao facto de que também os benefícios fiscais são definidos na base de uma fattispecie, temos que se quanto a alguns deles, todos os elementos de que depende a sua atribuição são previstos na lei, outros, em especial aqueles que visam criar estímulos ou incentivos dirigidos a determinadas actividades (económicas) que o poder decisório (“político”) pretende desenvolver, incentivar ou potenciar, através modulação da sua atribuição de acordo

com a “intensidade” com que a actividade económica prevê atingir ou cumprir os parâmetros para “beneficiação”, então nesse caso a lei, prevendo o quadro geral de existência do benefício fiscal, deixa contudo, para outrem, a graduação paramétrica necessária à sua aplicação, tanto mais quanto são plúrimos e de difícil previsão legal os critérios e circunstância a atender na modulação da beneficiação fiscal.

2.1.1.6. Assim, do ponto de vista que temos vindo a analisar, outra coisa se não pode concluir a respeito da norma do n.º 9 do artigo 16.º do RFALEI senão a de que o quadro dos poderes tributários das autarquias locais quanto à existência de benefícios fiscais que neles possam caber, e em especial a isenções totais ou parciais (e, como vimos antes, a redução de taxas) carece sempre de (prévia) previsão legal. O que não quer dizer que todos os elementos necessários à determinação (em concreto) do benefício fiscal hajam de estar imperiosamente plasmados na lei, pois que esta pode deixar (ou pode não ter outra alternativa senão deixar) a outros níveis de normação – designadamente regulamentar – o poder de fixação dos parâmetros práticos para a sua concreta aplicação tendo em conta e em função dos resultados que se pretende atingir com a concessão do benefício.

Aliás, tendo presente os princípios gerais da actividade administrativa, que as câmaras municipais devem precipuamente observar, designadamente os princípios da legalidade, justiça, transparência, prossecução do interesse público e imparcialidade, devem aquelas fixar em regulamento as circunstâncias e parametrizações à luz das quais poderão ser concedidos os benefícios fiscais relativamente aos quais a lei deixa que outra entidade, no caso as camaras municipais, venham definir tais elementos, indispensáveis para que possam ser aplicados. O que não parece ser admissível é que as câmaras municipais possam conceder esses benefícios, de forma casuística e discricionária, sem que sejam publicamente conhecidos os critérios e parâmetros que podem conduzir à sua concessão.(…)

[22] Vd. José Casalta Nabais, A Autonomia Financeira cit., pág. 35.

[23] Em matéria de dever de decisão também a administração fiscal se encontra sujeita a um princípio de decisão (artigo 56.º da LGT) à luz do qual a administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo.

Por outro lado, a não conclusão do procedimento tributário (sendo que a concessão de certos benefícios fiscais, como é o caso, desenvolve-se através de procedimento próprio – artigo 54.º, n.º 1, al. d), da LGT, artigo 44.º, n.º1, al. d), e artigo 65.º do CPPT) dentro do prazo legalmente definido para o efeito (quatro meses – artigo 57.º, n.º 1, da LGT), faz presumir o (…) indeferimento [do pedido] para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial (artigo 57.º, n.º 5, da LGT).

[24] Vd. Diogo Freitas do Amaral, com a colaboração de Pedro Machete e Lino Torgal, Curso de Direito Administrativo, vol. II, 2.ª edição, págs. 427 e 458.

[25] Artigo 13.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.

[26] Artigo 66.º, n.º 1, e artigo 67.º, n.º 1, al. a), do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

[27] Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, os pedidos de regularização, alteração ou ampliação (…) devem ser apresentados no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

Tendo este diploma entrado em vigor no 1.º dia útil do segundo mês seguinte ao da sua publicação (artigo 24.º), ou seja, em 1 de Janeiro de 2015, deixará de vigorar (por inutilidade) logo que todos os pedidos apresentados no prazo nele fixado (ou seja até 1 de Janeiro de 2016), sejam apreciados e (definitivamente) decididos.

Home Pareceres Jurídicos até 2017 Declaração de reconhecimento de interesse do investimento para a região; Declaração de reconhecimento de interesse público.

Declaração de reconhecimento de interesse do investimento para a região; Declaração de reconhecimento de interesse público.

Declaração de reconhecimento de interesse do investimento para a região; Declaração de reconhecimento de interesse público.

 

Solicita o Presidente da Câmara Municipal de …, por seu ofício de …, referência n.º …, a emissão de parecer sobre a seguinte questão:

Recentemente, este Executivo Municipal tem sido confrontado com a necessidade de se pronunciar sobre pedidos de declarações apresentados por empresas, visando obter objetivos bem diferenciados, a saber:

  1. “Declaração de Reconhecimento do Interesse do Investimento para a Região, prevista no n.º 4 do artigo 23.º, do RFAI, inserido no Código Fiscal do Investimento – Decreto-Lei nº 162/2014, de 31 de Outubro, e destinada à obtenção de redução ou isenção de impostos municipais – lMl e lMT.
  2. “Declaração de Deliberação Fundamentada de Reconhecimento do Interesse Público Municipal”, prevista na alínea a), do nº. 4, do artigo 5º, do Decreto-Lei nº 165/2014, destinada a instruir processo de viabilização de indústrias a laborar e não completamente licenciadas;

A emissão destas declarações é da responsabilidade da Assembleia Municipal, por proposta fundamentada da Câmara Municipal, conforme decorre da Lei nº 73/20I3, de 3 de setembro.

No decorrer da apreciação dos pedidos, da sua fundamentação e das respetivas deliberações tomadas pela Câmara Municipal, surgiram dúvidas na interpretação da Lei, ainda vigentes.

Assim, pergunta-se

DRIIR – Declaração referida no ponto 1.

  1. a) Se o pedido, analisado internamente pelos serviços técnicos da CM, e constatando que o mesmo não cumpre nenhum ou cumpre apenas alguns dos requisitos legais, previstos no artigo 22º do Código Fiscal do lnvestimento anexo ao Decreto-Lei nº 162/2014, de 31 de outubro, para beneficiar de eventual redução ou isenção dos impostos municipais em causa, deve, ou não, ser submetido à apreciação do Executivo Municipal?
  2. b) Se sim, tem o Executivo Municipal competência para fundamentar positivamente a proposta e submete-la à Assembleia Municipal, para esta reconhecer o interesse e emitir a respetiva declaração, sabendo que a requerente não satisfaz ou satisfaz apenas parcialmente as exigências da Lei aplicável?

DDFRIPM – Declaração referida no ponto 2.

  1. c) Se se verificar que a Câmara Municipal faz uma apreciação negativa, ou não suficientemente positiva sobre este pedido, razão por que delibera fundamentar negativamente a pretensão, deve, ou não, emitir a respetiva proposta e submetê-la à Assembleia Municipal?

 

Apreciando

  1. Do pedido

O presente pedido de parecer consubstancia-se em duas questões que apresentando-se formal e aparentemente como semelhantes, respeitam, contudo, a diferentes materialidades.

A primeira delas tem a ver com a emissão de uma declaração – declaração de reconhecimento do interesse do investimento para a região – exigida no âmbito e como requisito para atribuição de determinados benefícios fiscais[1], cuja emissão o Código Fiscal do Investimento[2] comete às assembleias municipais ainda que a declaração se refira a interesse para a região – situando-se, assim, no campo tributário e do apoio ao investimento (subsidiação/auxílios de Estado).

A segunda delas, no aspecto que para aqui releva, tem a ver igualmente com a emissão de uma declaração visando a regularização de situações (desconformes), mas agora no campo da gestão e ordenamento do território e urbanismo no espaço municipal e do licenciamento (regularização do licenciamento) de actividades económicas diversas aí instaladas (de forma irregular).

Questiona-se, quanto à primeira, se um pedido de um requerente, que ao ser analisado pelos serviços da camara se constata não preencher o requerente todos os requisitos legais, deve, ainda assim ser submetido à assembleia municipal e, em caso afirmativo, se a câmara municipal tem que fundamentar positivamente a proposta para que a assembleia reconheça positivamente o interesse regional, quando sabe que faltam requisitos legais ao requerente, pretenso beneficiário.

Quanto à segunda, a questão que se coloca é a de saber se quando a câmara municipal formula um juízo desfavorável, total ou parcialmente, à pretensão do requerente, denegando-lhe acolhimento, deve ainda assim submete-la à apreciação da assembleia municipal.

 

  1. Análise

2.1. O reconhecimento do interesse do investimento para a região previsto no artigo 23.º, n.º 4 do Código Fiscal do Investimento

2.1.1. De entre os diversos regimes de benefícios fiscais[3] previstos no Código Fiscal do Investimento, encontra-se o designado Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI)[4], com a natureza de auxílio de Estado com finalidade regional e, como tal, admitido pelo Regulamento (EU) n.º 651/2014[5].

2.1.1.1. O âmbito subjectivo do RFAI é definido no artigo 22.º, n.º 1, do CFI: podem dele beneficiar os sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º do mesmo código, e que são elencados na Portaria n.º 282/2014, de 30 de Dezembro.

2.1.1.2. Os benefícios fiscais concedidos no âmbito do RFAI consistem:

  1. na dedução à colecta de IRC[6] de uma percentagem[7] do valor das designadas aplicações relevantes[8], a efectuar a quando da liquidação de IRC respeitante ao período de tributação em que sejam realizadas as aplicações relevantes, até aos limites previstos no CFI[9];
  2. na isenção ou redução do IMI[10], aplicável de acordo com o previsto no CIMI;
  3. na isenção ou redução do IMT[11], aplicável de acordo com o previsto no CIMT;
  4. na isenção do Imposto de Selo[12], aplicável de acordo com o previsto no Código do Imposto de Selo.

2.1.2. Neste contexto, cabe sublinhar que quer o IMI quer o IMT são designados de “impostos municipais”[13], o que dá (a falsa) ideia de que eles não só são criados como são também administrados pelas autarquias locais, ao abrigo dos poderes tributários que a Constituição lhes confere[14]. Contudo, não é assim. Não só esses impostos (como todos os demais) são criados (lançados) por lei, por força do princípio (constitucional) da legalidade fiscal[15] (e, portanto, não são criados nem lançados pelas autarquias locais) como só o produto da sua cobrança é que verdadeiramente é municipal, constituindo receita do município onde é cobrado[16].

Por outro lado, em relação a qualquer desses impostos, todas as fases da respectiva gestão ou administração – ou seja, o seu lançamentoliquidação e respectiva cobrança – cabem a, e correm pela, administração fiscal do Estado, vulgo “finanças”[17].

2.1.2.1. Assim sendo, o reconhecimento da existência (verificação e declaração) ou a concessão[18] de benefícios fiscais em sede de IMI e IMT ‑ ou seja da isenção destes impostos ou da redução da sua imposição ‑ é tarefa que cabe exclusivamente à administração fiscal[19].

Contudo e apesar de assim ser, a lei prevê que em certos casos os municípios sejam chamados a pronunciar-se sobre (a concessão de) certos benefícios fiscais e, mais especificamente, quanto à própria gradação do benefício, quando a lei permita não só a isenção de imposto[20] mas também a redução da imposição fiscal (a operar, em regra, através ou da redução da taxa ou da matéria colectável)[21], em função dos objectivos a atingir com a concessão do beneficio.

2.1.3. A atribuição, no âmbito do RFAI, dos benefícios fiscais de natureza municipal (por incidirem sobre os imposto municipais sobre imóveis e sobre transmissão onerosa de imóveis) e, por essa razão, na dependência do poder tributário municipal[22], há-de pressupor necessariamente, antes do mais, e em razão de o concreto benefício a conceder poder consistir ou na isenção desses impostos ou na redução dos mesmos, a existência de normas (regulamentares ao nível do município) que disciplinem a essa concessão não só pela definição das concretas situações que mereçam o benefício como da gradação do benefício em função da ponderação (graduação) da relevância do investimento em termos do seu interesse para a região.

2.1.4. Definida que seja desse modo a fattispecie destes benefícios e analisado um dado pedido à luz da normação (regulamentar) aprovada para o efeito, coloca-se a questão de saber se face ao procedimento aprovatório previsto na lei – reconhecimento/concessão do benefício através deliberação fundamentada da assembleia municipal sob proposta da câmara – esta, (a câmara municipal) deverá submeter o pedido à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e possa] controlar) (para que aquela se pronuncie negativamente, presume-se), ou se, de forma mais extreme, a câmara municipal deve fundamentar positivamente um pedido ainda que constate que o mesmo não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a sua concessão.

Curiosamente, as questões antes referidas merecem respostas de sentido opostos.

2.1.4.1. A primeira delas – saber se a câmara municipal deverá (sempre) submeter o pedido (de beneficio) à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e ela possa] controlar) – merece resposta em sentido positivo, ou seja, caberá sempre (e unicamente) à assembleia municipal pronunciar-se em sentido positivo (reconhecendo) ou negativo (denegando o reconhecimento) sobre a verificação do interesse (público) municipal na concessão do benefício e a medida em que o mesmo deve ser concedido (sendo esse o caso), evidentemente louvando-se em proposta da câmara municipal.

2.1.4.2. A segunda questão – a que se prende com saber se a câmara municipal deve fundamentar positivamente um pedido ainda que constate que o mesmo não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a sua concessão – merece, obviamente, resposta negativa.

Na verdade, neste caso (como aliás em todos os casos) a assembleia municipal pronuncia-se sobre proposta camarária – não formula uma proposta própria; e a proposta da câmara deve basear-se e ter em conta a análise de todos os aspectos, e também os aspectos legais, que caibam dentro do seu poder de análise e proposta, razão pela qual a câmara municipal não pode nem deve, perante uma situação que se lhe afigura como não integralmente respeitadora do quadro normativo aplicável, ponderar uma proposta favorável à pretensão analisada e submetê-la assim à decisão da assembleia municipal. Na verdade, num caso assim, deve a proposta da câmara manifestar o seu pendor desfavorável à pretensão, para que a assembleia municipal a aprove nesse esse sentido.

2.1.4.3. Relativamente a ambas as referidas situações cabe realçar que:

  1. a) as razões que possam servir para fundamento de uma análise conducente a uma proposta negativa da câmara municipal (a ser posteriormente submetida à assembleia municipal) carecem, necessariamente, de caber dentro dos poderes de apreciação da câmara. Quer isto dizer que cabendo à administração fiscal conduzir o procedimento de concessão de benefícios fiscais, não pode a câmara municipal invocar argumentos que se situem fora ou para além do seu âmbito (material e procedimental) de intervenção para responder desfavoravelmente (e, obviamente, também de forma favorável), sob pena de vício de incompetência.
  2. b) em ambos os casos, essencial é que a administração (especialmente a câmara municipal) não faça silêncio sobre o assunto que lhe foi submetido, dispensando-se ou abstendo-se de se pronunciar (ainda que negativamente) sobre o pedido, alegadamente por, no seu entender, ele carecer de (qualquer) fundamento, e portanto, falecendo de argumentos que possam permitir a sua apreciação positiva (concedente) pela assembleia municipal[23].

 

2.2. deliberação fundamentada de reconhecimento do interesse público municipal na regularização de estabelecimento ou instalação prevista no artigo 5.º, n.º 4, al. a) do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro – Regime excepcional e transitório de regularização de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos

 2.2.1. Na segunda das questionadas situações, a que a epígrafe supra alude, o que está em causa é o reconhecimento (também pela assembleia municipal sob proposta da câmara municipal) do interesse público municipal na regularização – compreendendo-se nesta não só a regularização stricto sensu mas também a alteração e a ampliação – de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos em situação irregular, mormente face ao disposto nos instrumentos de gestão territorial vigentes.

Nos termos da lei, à luz do Decreto-Lei n.º 165/2014, este reconhecimento constitui mesmo condição prévia indispensável para que se possa desencadear o processo de regularização das situações irregulares, mormente em matéria de desconformidade da localização com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares, servidão administrativa ou restrição de utilidade pública (e, aparentemente, em face do que é dito na Portaria n.º 68/2015, de todo e qualquer pedido de regularização).

2.2.2. Também nesta situação o órgão competente para efectuar o reconhecimento do interesse público municipal é a assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal. É quanto resulta do disposto na al. a) do n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro, quando alude a deliberação fundamentada … emitida pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal.

Desta norma podem-se já retirar algumas conclusões consequenciais.

A primeira é a de que o órgão competente para o reconhecimento (ou seja, para a prática de um acto administrativo com esse conteúdo) é a assembleia municipal através de uma sua deliberação aprovada na devida forma.

Porém, aqui, a lei não se basta com a mera aprovação da deliberação por votação maioritária, exigindo também que essa deliberação seja fundamentada. O que implica que a acta contenha não só a descrição da proposta e da sua aprovação como também os fundamentos em que assenta o sentido da mesma, que podem ser dados por remissão para a proposta da câmara caso o conteúdo desta seja adequado a ser considerado como fundamentação.

Por outro lado, se a deliberação da assembleia municipal pressupõe e assenta necessariamente em proposta da câmara municipal, então cabe à camara municipal apreciar todo e qualquer pedido que lhe seja apresentado e propor à assembleia a decisão que melhor considere de acordo com o (conforme ao) interesse público municipal, quer ela seja a de reconhecimento desse interesse quer a do seu não reconhecimento.

Serve isto por dizer que mesmo no caso em que a câmara municipal venha a considerar, tudo apreciado, que o caso constante da pretensão do requerente não se reveste de interesse público municipal pelo que não é susceptível de merece o seu reconhecimento pelo órgão deliberativo municipal, não deve nem pode deixar de submeter à assembleia municipal uma proposta nesse sentido (negativo), pois que só a ela, assembleia, cabe em ultima instância, reconhecê-lo ou não.

Qualquer pronúncia da câmara municipal que pretenda arvorar-se a decisão final do assunto constituirá um acto anulável, por incompetência (relativa)[24].

De referir ainda que à luz do princípio da decisão[25] todos os órgãos da Administração Pública têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (…), pelo que a pura e simples omissão de pronúncia sobre um pedido de particular (ainda que o desatendimento do pedido seja plenamente justificável) permite a este intentar uma acção administrativa contra a entidade omitente, visando a sua condenação à prática do acto administrativo devido[26].

2.2.3. De referir, epilograficamente, que tratando-se o Decreto-Lei n.º 165/2014, ora em apreço, de norma excepcional e transitória[27], estas aludidas situações estão necessariamente circunscritas no tempo, sendo insusceptíveis de continuidade e indefinida repetição.

  

 

Concluindo

= I =

  1. No âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), previsto no Código Fiscal do Investimento, podem ser concedidos benefícios fiscais em sede de IRC sob a forma de dedução à colecta, em sede de IMI ou IMT sob a forma de isenção ou redução do imposto e em sede de Imposto do Selo sob a forma de isenção do imposto.
  2. Apesar do IMI e do IMT apresentarem a designação de “impostos municipais”, apenas o produto da sua cobrança é que verdadeiramente é municipal, constituindo receita do município onde é cobrado.
  3. Em relação a qualquer destes impostos, todas as fases da respectiva gestão ou administração – ou seja, o seu lançamentoliquidação e respectiva cobrança – cabem a, e correm pela, administração fiscal do Estado, vulgo “finanças”.
  4. Por essa razão, o reconhecimento da existência (verificação e declaração) ou a concessão de benefícios fiscais em sede de IMI e IMT, ou seja da isenção destes impostos ou da redução da sua imposição, constitui tarefa que cabe exclusivamente à administração fiscal.
  5. Contudo a lei prevê que em certos casos os municípios sejam chamados a pronunciar-se sobre (a concessão de) certos benefícios fiscais e, mais especificamente, quanto à própria gradação do benefício, quando a lei permita não só a isenção de imposto mas também a redução da imposição fiscal (a operar, em regra, através ou da redução da taxa ou da matéria colectável) , em função dos objectivos a atingir com a concessão do beneficio.
  6. A atribuição, no âmbito do RFAI, dos benefícios fiscais de natureza municipal (por incidirem sobre os imposto municipais sobre imóveis e sobre transmissão onerosa de imóveis) há-de pressupor necessariamente, antes do mais, a existência de normas (regulamentares ao nível do município) que disciplinem a essa concessão não só pela definição das concretas situações que mereçam o benefício, como da gradação do benefício em função da ponderação (graduação) da relevância do investimento em termos do seu interesse para a região.
  7. Definida que seja a fattispecie dos benefícios e analisado um dado pedido à luz da normação (regulamentar) aprovada para o efeito, a câmara municipal deverá submeter sempre o pedido à apreciação da assembleia municipal mesmo quando constate que ele não preenche as exigências legais para o efeito (e que à autarquia caiba [e possa] controlar) pois que, em todo o caso, cabe unicamente à assembleia municipal pronunciar-se em sentido positivo (reconhecendo) ou negativo (denegando o reconhecimento) sobre a verificação do interesse (público) municipal na concessão do benefício e sobre a medida em que o mesmo deve ser concedido (sendo esse o caso), louvando-se, para o efeito, em proposta da câmara municipal.
  8. No caso em que a câmara municipal constate que um pedido não se quadra, ou apenas o faz parcialmente, nos requisitos – na fattispecie – legal e/ou regulamentarmente estipulados para a concessão do benefício, a proposta da câmara deve basear-se e ter em conta a análise de todos os aspectos, e também os aspectos legais que caibam dentro do seu poder de análise e proposta, pelo que a sua proposta deve manifestar o seu pendor desfavorável à pretensão, para que a assembleia municipal a aprove nesse esse sentido.
  9. As razões que possam servir para fundamento de uma análise conducente a uma proposta negativa da câmara municipal carecem de caber dentro dos poderes de apreciação da câmara, não podendo a câmara municipal invocar argumentos que se situem fora ou para além do seu âmbito (material e procedimental) de intervenção para responder desfavorável ou favoravelmente, sob pena de incompetência.
  10. Não pode a administração (especialmente a câmara municipal) fazer silêncio sobre o assunto que lhe foi submetido a apreciação, dispensando-se ou abstendo‑se de se pronunciar sobre ele (ainda que negativamente), alegadamente por, no seu entender, ele carecer de (qualquer) fundamento, e portanto, fenecendo-lhe razões que possam levar à sua apreciação positiva (concedente) pela assembleia municipal.

 

= II =

  1. O reconhecimento pela assembleia municipal sob proposta da câmara municipal do interesse público municipal na regularização, alteração e ampliação de estabelecimentos industriais, explorações pecuárias, explorações de pedreiras e explorações onde se realizam operações de gestão de resíduos em situação irregular, designadamente quanto aos instrumentos de gestão territorial vigentes, previsto no Decreto-Lei n.º 165/2014, constitui condição prévia indispensável para que se possa desencadear o processo de regularização dessas situações, mormente em matéria de desconformidade da localização com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares, servidão administrativa ou restrição de utilidade pública.
  2. Resulta do disposto na al. a) do n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, de 5 de Novembro, quando alude a deliberação fundamentada … emitida pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal que:
    1. o órgão competente para o reconhecimento (ou seja, para a prática de um acto administrativo com esse conteúdo) é a assembleia municipal através de uma sua deliberação aprovada na devida forma.
    2. tal deliberação deve ser fundamentada. devendo a acta conter não apenas a descrição da proposta e sua aprovação como também os fundamentos em que assenta o sentido da mesma, os quais podem resultar de remissão para a respectiva proposta da câmara, caso possa ser considerada apta para tal.
  3. Cabe à camara municipal apreciar todo e qualquer pedido que lhe seja presente e levar à assembleia municipal a proposta que, sobre ele, melhor considere de acordo com o (e conforme ao) interesse público municipal, quer ela seja a de reconhecimento desse interesse quer a do seu não reconhecimento.
  4. Mesmo no caso de a câmara municipal considerar que o caso constante da pretensão do requerente não se reveste de interesse público municipal não deve nem pode deixar de submeter à assembleia municipal uma proposta, em sentido negativo, pois que só à assembleia municipal cabe pronunciar-se, reconhecendo ou não a existência desse interesse.
  5. Qualquer pronúncia da câmara municipal que pretenda ter a natureza de decisão final do assunto constituirá um acto anulável, por incompetência (relativa).
  6. À luz do princípio da decisão, todos os órgãos da Administração Pública têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (…).
  7. A pura e simples omissão de pronúncia sobre um pedido de particular (ainda que o desatendimento do pedido seja plenamente justificável) permite a este intentar uma acção administrativa contra a entidade omitente, visando a sua condenação à prática do acto administrativo devido.

  

Salvo sempre meliori judicio

  

Ricardo da Veiga Ferrão

(Jurista. Técnico Superior)

 

[1] Mais precisamente, no âmbito do designado Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), previsto no capítulo III do CFI.

[2] O Código Fiscal do Investimento (CFI) foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de Outubro, rectificado pela Declaração de Retificação n.º 49/2014, de 1 de Dezembro, e alterado pela Lei n.º 7‑A/2016, de 30 de Março.

[3] Entende-se por benefícios fiscais, à luz do disposto no Estatuto dos Benefícios Fiscais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, com posteriores alterações) as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.º, n.º 1, do EBF), e que podem assumir a forma de isenções, (…) reduções de taxas, (…) deduções à matéria colectável e à colecta, (…) amortizações e reintegrações aceleradas e outras medidas fiscais (…) (artigo 2.º, n.º 2, do EBF).

De sublinhar que os benefícios fiscais são considerados despesas fiscais, as quais podem ser previstas no Orçamento do Estado ou em documento anexo e, sendo caso disso, nos orçamentos das Regiões Autónomas e das autarquias locais (artigo 2.º, n.º 3, do EBF).

[4] Artigo 1.º, n.º 1, al. b), e Capítulo III (artigos 22.º a 26.º) do CFI.

[5] Artigo 1.º, n.º 2, do CFI.

[6] Artigo 23.º, n.º 1, al. a), do CFI.

[7] As diferentes percentagens são as definidas nas subal. 1) e 2) da al. a), do n.º 1, do artigo 23.º do CFI.

[8] O CFI considera aplicações relevantes os investimentos efectuados no elenco de activos constante do artigo 22.º, n.º, 2 do CFI, desde que se encontrem afectos à exploração da empresa.

[9] Artigo 23.º, n.º 2, do CFI.

[10] Artigo 23.º, n.º 1, al. b), do CFI.

[11] Artigo 23.º, n.º 1, al. c), do CFI.

[12] Artigo 23.º, n.º 1, al. d), do CFI.

[13] Diz o artigo 2.º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, que este diploma aprova (…) o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) (…)   (…) o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) (…) .

[14] Artigo 238.º, n.º 4, da Constituição.

[15] Vd. artigo 103.º, n.º 2, da Constituição.

[16] É o que resulta do disposto no artigo 14.º, als. a) e b), do Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais, constante da Lei n.º 73/2013, de 3 de Setembro, com posteriores alterações, ao afirmar que constituem receitas municipais …. o produto da cobrança do … IMI e do IMT.

Portanto, mas não unicamente por esta razão, apesar dos impostos em causa apresentarem a designação pomposa de Imposto Municipal, ambos continuam a ter uma feição manifestamente estadual. Sobre esta questão vd. José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 6.ª edição, 2010, págs. 56-60 (edição consultada; porém, há edição mais recente: 9.ª edição, 2016).

[17] Cfr. José Casalta Nabais, Direito Fiscal cit, págs. 57, e A Autonomia Financeira das Autarquias Locais, 2007, pág. 41-42.

[18] Como se diz em nosso anterior Parecer 100/2016, os benefícios fiscais ou operam automaticamente (benefícios automáticos) por resultarem directa e imediatamente da lei ou carecem de ser reconhecidos (benefícios dependentes de reconhecimentopressupondo um ou mais actos posteriores de reconhecimento [Artigo 5.º, n.º 2, do EBF] os quais podem consistir em um acto administrativo ou em um acordo entre a administração fiscal e os interessados [Artigo 5.º, n.º 3, do EBF], regulando-se o respectivo processo pelo disposto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário [Artigo 5.º, n.º 4, do EBF].

[19] Diz-se no antecitado nosso Parecer 100/2016:

2.1.2.1. O artigo 15.º do RFALEI diz que os municípios, relativamente a impostos e outros tributos a cuja receita tenham direito, podem ter os poderes tributários para a sua liquidação e cobrança(26). Porém, tais poderes só existirão nos municípios nos termos a definir por diploma próprio – facto que ainda não ocorreu.

[(26) Artigo 17.º, n.º 4, do RFALEI. O artigo 17.º, n.ºs 2 e 3, do RFALEI prevê a possibilidade de, no quadro que vier a ser definido em diplomas específicos, ainda inexistentes, as câmaras municipais virem a deliberar proceder à cobrança dos impostos municipais, pelos seus próprios serviços ou pelos serviços da entidade intermunicipal que integram, desde que correspondente ao território da NUTS III ou então, poderem transferir a competência de cobrança dos impostos municipais para o serviço competente das entidades intermunicipais que integrem. Em qualquer dos casos, porém, a lei nunca fala da liquidação, pelo que a competência para esta residirá sempre nos serviços do Estado, enquanto não houver diploma que especificamente venha regular a competência para o seu exercício.]

Temos assim, portanto, que aos municípios não assiste qualquer poder para a prática de actos de liquidação cobrança dos ditos impostos municipais – IMI, IMT e derramas – os quais continuam a ser liquidados e cobrados nos termos (…) [da] respectiva legislação, pelos serviços do Estado (administração tributária/”finanças”), razão pela qual as câmaras remuneram o Estado pela realização de tais tarefas(27), transferindo este, posteriormente, para cada autarquia a respectiva receita dos imposto cobrados, líquida dos referidos encargos(28).

[(27) Artigo 15.º, al. b), do RFALEI.] [(28) Artigo 17.º, n.º 5, do RFALEI.] [20] No caso da isenção (total) a decisão passa unicamente por, de modo binário, conceder/ não conceder o benefício/isenção.

[21] Respigando ainda o nosso citado Parecer 100/2016:

(…)os (…) [benefícios fiscais dinâmicos ou incentivos ou estímulos fiscais] visam incentivar ou estimular determinadas actividades, estabelecendo para o efeito, uma relação entre as vantagens atribuídas e as actividades estimuladas em termos de causa-efeito. Enquanto naqueles a causa do benefício é a situação ou actividade em si mesma, nestes a causa é a adopção (futura) do comportamento beneficiado ou o exercício (futuro) da actividade fomentada.(24)

[(24)JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal cit, págs. 434.]

Por estas razões e face ao quadro de óbvia indeterminabilidade e variação das potenciais situações a considerar, bem se compreende (…) [não só] que os incentivos fiscais, que não raro assumem carácter selectivo ou mesmo altamente selectivo, tenham carácter temporário, (…) como a liberdade do legislador, mormente para conceder uma margem de livre decisão à administração tributaria, tenha necessariamente de ser maior do que aquela de que dispõe em sede dos benefícios fiscais estáticos.(25)(sublinhado nosso)

[(25) JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal cit, págs. 435.]

2.1.1.5. Se atendermos agora ao facto de que também os benefícios fiscais são definidos na base de uma fattispecie, temos que se quanto a alguns deles, todos os elementos de que depende a sua atribuição são previstos na lei, outros, em especial aqueles que visam criar estímulos ou incentivos dirigidos a determinadas actividades (económicas) que o poder decisório (“político”) pretende desenvolver, incentivar ou potenciar, através modulação da sua atribuição de acordo

com a “intensidade” com que a actividade económica prevê atingir ou cumprir os parâmetros para “beneficiação”, então nesse caso a lei, prevendo o quadro geral de existência do benefício fiscal, deixa contudo, para outrem, a graduação paramétrica necessária à sua aplicação, tanto mais quanto são plúrimos e de difícil previsão legal os critérios e circunstância a atender na modulação da beneficiação fiscal.

2.1.1.6. Assim, do ponto de vista que temos vindo a analisar, outra coisa se não pode concluir a respeito da norma do n.º 9 do artigo 16.º do RFALEI senão a de que o quadro dos poderes tributários das autarquias locais quanto à existência de benefícios fiscais que neles possam caber, e em especial a isenções totais ou parciais (e, como vimos antes, a redução de taxas) carece sempre de (prévia) previsão legal. O que não quer dizer que todos os elementos necessários à determinação (em concreto) do benefício fiscal hajam de estar imperiosamente plasmados na lei, pois que esta pode deixar (ou pode não ter outra alternativa senão deixar) a outros níveis de normação – designadamente regulamentar – o poder de fixação dos parâmetros práticos para a sua concreta aplicação tendo em conta e em função dos resultados que se pretende atingir com a concessão do benefício.

Aliás, tendo presente os princípios gerais da actividade administrativa, que as câmaras municipais devem precipuamente observar, designadamente os princípios da legalidade, justiça, transparência, prossecução do interesse público e imparcialidade, devem aquelas fixar em regulamento as circunstâncias e parametrizações à luz das quais poderão ser concedidos os benefícios fiscais relativamente aos quais a lei deixa que outra entidade, no caso as camaras municipais, venham definir tais elementos, indispensáveis para que possam ser aplicados. O que não parece ser admissível é que as câmaras municipais possam conceder esses benefícios, de forma casuística e discricionária, sem que sejam publicamente conhecidos os critérios e parâmetros que podem conduzir à sua concessão.(…)

[22] Vd. José Casalta Nabais, A Autonomia Financeira cit., pág. 35.

[23] Em matéria de dever de decisão também a administração fiscal se encontra sujeita a um princípio de decisão (artigo 56.º da LGT) à luz do qual a administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo.

Por outro lado, a não conclusão do procedimento tributário (sendo que a concessão de certos benefícios fiscais, como é o caso, desenvolve-se através de procedimento próprio – artigo 54.º, n.º 1, al. d), da LGT, artigo 44.º, n.º1, al. d), e artigo 65.º do CPPT) dentro do prazo legalmente definido para o efeito (quatro meses – artigo 57.º, n.º 1, da LGT), faz presumir o (…) indeferimento [do pedido] para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial (artigo 57.º, n.º 5, da LGT).

[24] Vd. Diogo Freitas do Amaral, com a colaboração de Pedro Machete e Lino Torgal, Curso de Direito Administrativo, vol. II, 2.ª edição, págs. 427 e 458.

[25] Artigo 13.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.

[26] Artigo 66.º, n.º 1, e artigo 67.º, n.º 1, al. a), do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

[27] Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 165/2014, os pedidos de regularização, alteração ou ampliação (…) devem ser apresentados no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

Tendo este diploma entrado em vigor no 1.º dia útil do segundo mês seguinte ao da sua publicação (artigo 24.º), ou seja, em 1 de Janeiro de 2015, deixará de vigorar (por inutilidade) logo que todos os pedidos apresentados no prazo nele fixado (ou seja até 1 de Janeiro de 2016), sejam apreciados e (definitivamente) decididos.